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Homilia Ordenação

BONDADE ORIGINAL, MANSA, TERNA, MATERNAL        

1. A nossa amada Igreja de Lamego assinala hoje a Dedicação desta Casa-mãe a Deus, nosso Pai, a quem foi solenemente entregue a 20 de novembro de 1776, após a realização de diversos lanços de obras. Mas já antes, desde tempos bem remotos, aqui se reuniam os seus filhos, aqui se dedicavam e entregavam a Deus, à escuta da sua Palavra, à fração do pão, à comunhão e à oração. Exulta, pois, Igreja de Lamego, mas lembra-te sempre que a Dedicação desta Casa-mãe a Deus, nosso Pai, reclama também de ti, hoje e sempre, dia após dia, a tua plena Dedicação a Deus. Por isso, aqui estamos hoje, festivamente reunidos como filhos e irmãos, para celebrar com a Igreja inteira a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, a que acresce hoje também a Ordenação Diaconal do Eleito Diogo Martinho, da Paróquia de S. Pedro de Gosende.

2. A «Festa de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei», com esta denominação, foi instituída pelo Papa Pio XI, em 11 de Dezembro de 1925, com a Carta Encíclica Quas Primas. Os tempos apresentavam-se sombrios e turvos e os céus nublados como os de hoje, e Pio XI, homem de ação, que já tinha fundado a Ação Católica em 1922, instituiu então esta Festa com o intuito de promover a militância católica e ajudar a sociedade a revestir-se de valores e hábitos cristãos. A Festa de Cristo Rei era então celebrada no último Domingo de Outubro. A reorganização da Liturgia no pós Concílio passou esta Festa para o último Domingo do Ano Litúrgico, alterando-lhe a denominação para «Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo».

3. «O Senhor Reina». É assim que abre o Salmo 93, que hoje cantamos, e que deve continuar a ecoar na nossa alma. Não, não tem nada a ver com os reis que conhecemos, vestidos a rigor e coroados, e que dominam as nações com decretos, impostos e armas. Em linguagem bíblica, e em modo divino, reinar é salvar, justificar, perdoar, criar e recriar, coisas que só Deus sabe e pode fazer, sempre em nosso proveito.

4. É assim que a Liturgia deste Dia Solene nos apresenta um Rei novo, o único Rei que não reina desde fora, isto é, à força. É apresentado também como o Filho do Homem, logo identificado com Jesus Cristo, «Aquele-que-nos-ama». Se não reina desde fora, como os outros, com armas, decretos e impostos, então reina desde dentro, desde o coração, movendo com doçura e mansidão as cordas do nosso coração.

5. Claramente: este Rei novo e Filho do Homem remete para o Homem de Génesis 1, criado à imagem de Deus, a quem Deus confia o domínio manso e doce sobre toda a sua bela e boa criação. Sim, não é pela brutalidade, mas pela doçura da palavra, à imagem de Deus, que cria falando e não lutando, que o Homem de Génesis 1 deve exercer o domínio ou o reinado sobre toda a criação, cuidando dela com Amor e mantendo-a no estado de «bondade original», tal como Deus no-la entregou.

6. Este Homem bom de Génesis 1 atravessa a Escritura Santa, aparecendo à distância narrativa, já não como o Homem, mas como o Filho do Homem, a quem cabe a mesma missão do Homem de Génesis 1. Para se ter uma ideia, o Filho do Homem aparece no Livro de Ezequiel por 93 vezes, muitas vezes no Livro de Daniel, muitas vezes no Apocalipse, e atravessa os Evangelhos por 82 vezes. Aqui, nos Evangelhos, Filho do Homem é mesmo o modo como Jesus se diz a si mesmo. Então, verdadeiramente, o Filho do Homem, Jesus Cristo, Aquele-que-nos-ama, Rei manso e novo, está identificado, e identificada está a sua missão: Ele vem para amar, abraçar, sofrer, sorver, absolver e dissolver o poder da brutalidade que habita os impérios deste mundo, também o meu e o teu, não nos esqueçamos, assentes no poder, na ambição e na violência. Ele vem restabelecer aquele mundo da «bondade original», que nós transformámos em mundo imundo da «maldade original» ou «pecado original».

7. Face a este reinado manso e doce, todos os impérios caem e se pulverizam! É assim que sucumbem as bestas do Livro de Daniel, e também, não nos esqueçamos, queridos irmãos e irmãs, as bestas ferozes que há em nós, e que, como Caim, não falam manso e doce, nem sequer falam nem amam, mas trucidam, espezinham, comem e cospem o irmão ou os irmãos.

8. Pilatos face a Jesus: «Portanto, tu és Rei!». «Sim, sou Rei», responde Jesus, mas «o meu Reino não é deste mundo, não é daqui. Se o meu Reino fosse daqui, Pilatos, seria como o teu, e aí estariam os meus exércitos para me defender!». «Eu vim», diz Jesus, o Rei, o Filho do Homem, Aquele-que-nos-ama, «para dar testemunho da verdade». Entenda-se: para dar testemunho da mansidão, da confiança e da ternura, para ser neste mundo líquido, indiferente e insensível, um arrimo sólido que transpire e inspire bondade, beleza e confiança. Percebe-se tudo isto melhor se vos disser que, na língua hebraica, verdade se diz ՚emet, cuja etimologia remete para ՚em, que é como se diz «mãe» na língua hebraica.

9. Portanto, Jesus, Aquele-que-nos-ama, Rei, Filho do Homem, traz consigo uma cultura maternal, uma missão maternal, bondade e beleza original. Vem, Senhor Jesus! Alumia com a tua Luz nova as trevas, as pregas e as pedras do nosso empedrado, empedernido, engessado e alcatroado coração. Reina sobre nós, Salva-nos, Justifica-nos, Perdoa-nos, Recria-nos. Faz-nos outra vez à tua Imagem. Dissolve a besta brava que há em nós e que, à imagem de Caim, não fala, mas trucida, espezinha e come o outro. Hoje é o Dia da celebração de um amor novo e de uma nova ordem assente, não no poder, mas no amor manso e maternal.

10. Caríssimo Diogo Martinho, Eleito para a Ordem dos Diáconos, aí tens a missão bela e boa que, em nome do nosso Bom Deus, hoje te confio.

 

 

Lamego, 25 de novembro de 2018, Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo
+ António, vosso bispo e irmão

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