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Mosteiro Nossa Senhora da Eucaristia - Monjas contemplativas de Clausura

Por ocasião da comemoração litúrgica de São Domingos, e do Jubileu que assinalou os 800 anos da sua morte, a 8 de agosto, visitámos o Mosteiro das monjas contemplativas, estivemos à conversa com a Madre Prioresa, Ir. Glória Trindade Domingos, inteiramo-nos do dia a dia das irmãs, em clausura, no tempo em que vivemos, os afazeres, preocupações, projetos e a relação com o mundo.

 

Voz de Lamego – Quer falar-nos da sua vocação à Vida Contemplativa?

Desde muito cedo, conheci muitas Congregações Religiosas. Afinal, acabei por abraçar a vida Contemplativa de Clausura. Digo de Clausura porque todos podemos ser contemplativos, de clausura nem todos. Fascinou-me o silêncio e a vida escondida dedicada totalmente para Deus. A sua eficácia é como o coração que pulsa cá dentro, embora esteja protegido pelo tórax ou como as raízes de uma árvore, traz a vida desde baixo e ninguém a vê. Muita gente não compreende ou mesmo afirma que é inútil a vida contemplava. Sem a dimensão contemplativa da nossa vida, secamos como uma árvore sem raízes profundas. O livro do Apocalipse ajuda-nos a compreender esta dimensão contemplativa da vida: “Ao que vencer, darei Eu a comer o maná escondido, e dar-lhe-ei uma pedra branca na qual estará escrito um nome que ninguém conhece, a não ser a quem lhe foi dado a conhecer” (Ap 2,17b). O primeiro chamamento foi o dom da minha vida para este mundo e o segundo nascimento pelo Batismo. A partir do Batismo, Deus chama-nos para uma missão, a vida Consagrada.
Aos 10 anos senti-me chamada, fortemente tocada por Deus. Queria ser monja, mas não sabia como, porque nunca tinha tido qualquer contacto com um convento de monjas contemplativas. Nessa altura, ainda não tinha recebido o Batismo. Sentia um fogo cá dentro de mim… Ao ser batizada aos 13 anos e confirmada aos 15 anos, conheci as monjas através de uma amiga da minha paróquia. Fiquei cativada pela alegria que as monjas transmitiam através das grades de um convento. Depois deste chamamento veio outro, que é a minha missão agora na Diocese de Lamego.

VL – Qual o percurso em Angola, até chegar à Diocese de Lamego?

O Frei Filipe Rodrigues OP, visitador desta Comunidade, na sua estada por Angola, visitou os nossos Mosteiros de Kuito e Benguela. Na segunda Comunidade mais jovem, ele fez-nos a proposta de ajudarmos o Mosteiro de Lamego onde só havia três irmãs, idosas e doentes e também porque o Mosteiro de Lamego pertencia à nossa Federação. Mas estas irmãs, com pouco anos de fundação no Kuito, encaminharam-no para o Mosteiro Mãe de Benguela e, quando lá chegou, fez-nos a mesma proposta. Depois de algumas dúvidas e incertezas, a Comunidade orou, estudou, e depois a conclusão foi unânime. Partir para Lamego e aí reforçar a Comunidade já existente.
Hoje posso dizer obrigada pelo trabalho dos Missionários que anunciaram o Evangelho por terras de África e também pelo facto de podemos dar uma resposta positiva de ajuda a um convento português. Tal como um dia os missionários deixaram tudo e partiram, hoje podemos assumir esta mesma missão aqui em Portugal. Depois de muita oração, nomeou-se um grupo de irmãs que aqui representam a Comunidade de origem.
Empreendemos a viagem rumo a Lamego, Diocese desconhecida para nós, mas amada. Quanto às três irmãs mais idosas, já tínhamos ouvimos falar da sua situação, pois somos da mesma Federação, (São Domingos Espanha).

VL – Como foi a adaptação neste Mosteiro tendo, em conta as três irmãs com idade já avançada, que já se encontravam aqui?

Adaptação foi pouco a pouca conseguida, mas não foi fácil. Os factos são múltiplos, mas posso cito alguns:
Somos diferentes na cultura e na diversidade das idades! Não foi fácil, mas foi possível. Ao sermos consagradas e da mesma Ordem Dominicana, muito ajudou para uma boa adaptação. A experiência das irmãs idosas, a compreensão das mais jovens, solidificou a adaptação e tornou-a cada vez mais consistente.

VL – O que fazem durante o dia? Que tempos dedicam a Oração? A questão das hóstias e outras ocupações?

Nas primeiras horas do dia colocamo-nos nas mãos de Deus, conscientes de que Ele está no meio de nós e, nesta atitude de fé, louvamos em comunidade o Bom Deus, sete vezes ao dia, assumindo o dever, que recebemos da igreja, de celebrar o Ofício Divino. Desde os primórdios da Ordem, somos chamados, enquanto membros da mesma, a evidenciar mais particularmente, a Igreja em oração. Assim. começamos o nosso dia com a oração do terço, já que somos da Ordem do Rosário, a oração Litúrgica de Laudes e, logo a seguir, a oração particular e a participação da Eucaristia.
Depois de 15 minutos de silêncio depois da Eucaristia, temos o pequeno-almoço e no fim, antes de começarmos os afazeres domésticos, reunimo-nos em volta da Imagem da Nossa Senhora que se encontra no centro do Claustro para agradecer a sua bondade e pedir a sua bênção para os nossos trabalhos na cozinha, lavandaria, nos afazeres agrícolas, na confeção de paramentos litúrgicos e de hóstias para a nossa Diocese de Lamego e outros trabalhos manuais.
É pela confeção das hóstias que conseguimos uma pequena ajuda para a nossa subsistência. Dentro deste âmbito, não esquecemos o “trabalho” primordial: a oração silenciosa, e a reza das horas litúrgicas que santificam o dia: laudes, tercia, sexta, Noa, vésperas, completas e Ofício de Leitura, tudo cantado solenemente. Todo o dia é envolvido pelo silêncio com exceção de dois pequenos recreios depois das refeições.

VL – Como viveram o tempo da Pandemia, sobretudo quando estivemos confinadas?

Vivemos e estamos a viver este tempo de pandemia, olhando-o também como um tempo de graça que Deus nos concede para avaliarmos os nossos comportamentos e a purificação das nossas vidas. Deus é Pai e como os bons pais, Deus não abandona os seus filhos, mas procura, por todos os meios, chamá-los à razão para que voltem ao bom caminho. É um verdadeiro tempo de purificação e conversão.
Todos os dias pedimos a Deus para sabermos aproveitar este tempo sofrido, mas também de graça e confiança, pois Deus não nos abandona ao nosso próprio destino.  Reconhecemos, igualmente, que não somos donos da ciência e do mundo e que há Alguém acima de nós que não nos deixa sós no meio do sofrimento. Além disso, a nossa vida está perfeitamente confinada.  Por isso, não percebíamos o que “era estar confinado” para as pessoas que têm uma vida ativa.  Aproveitamos o mais possível estes tempos conturbados para nos concentrarmos mais na nossa vocação de vida contemplativa, apresentando ao Senhor, com mais insistência, o sofrimento de tantos irmãos. Portanto para nós, foi um tempo muito bem aproveitado, além de vivermos mais concentradas na nossa vocação, aproveitamos, igualmente, para fazermos alguns trabalhos litúrgicos que durante o dia a dia não os podíamos fazer.

VL – Quais os desafios que são colocados na atualidade, às irmãs em Clausura?

O grande desafio para nós, Monjas Contemplativas, consiste em sermos capazes de continuar a procurar o Rosto de Deus através da profissão dos conselhos evangélicos. Apenas recordo dois textos que poderão responder à sua questão: “com os olhos da fé, num mundo que ignora a Sua presença, propondo ao homem de hoje uma vida casta, pobre e obediente a Jesus, como sinal credível e fiável da nossa consagração, tornando-nos «uma exegese viva da Palavra de Deus” q (Can.573 § 2 - “Vultum Dei n.º 2”); Vultum Dei, n.º 6: “A Igreja conta com a vossa Oração e imolação para levar os homens e mulheres do nosso tempo a Boa Notícia. Não é fácil que neste tempo o mundo entenda a vossa vocação especial e esta missão escondida, contudo o mundo tem necessidade dela como o marinheiro no mar alto precisa do farol que indique a rota para chegar ao Porto, assim o mundo tem necessidade de vós. Sede faróis. Sede rochas que acompanham o caminho dos homens. (Jo.14)

VL – Por estes dias completam-se 800 Anos da morte do Fundador, São Domingos de Gusmão. Que mensagens do Vosso Fundador ainda são significativas para este tempo?

São Domingos foi um homem de Oração.” Só falava com Deus ou de Deus”. Hoje, este perfil de vida é totalmente atual. Ontem, como hoje, precisamos da oração, para podermos falar aos homens de maneira convincente. O Estudo da Sagrada Escritura é também uma linha de força da identidade dominicana, porque ignorar as Escrituras é ignorar Cristo. Ontem, como hoje. Cristo é sempre o mesmo, vive entre nós e connosco. A alegria é também um distintivo dominicano. Ninguém foi mais afável como Domingos, no seu tempo. Queremos consubstanciar esta dimensão que nos carateriza. A consciência de nos sentirmos amadas por Deus, brota em nós, para amarmos também os outros. São Domingos amava todos e por todos era amado. Só amando o irmão, podemos perseverar na vocação.
Como Superiora desta comunidade quero agradecer, em nome de todas a Monjas, os gestos de proximidade de tantos e de tantas que se tornaram e são amigos do nosso Convento: sacerdotes, consagrados e cristãos leigos. Todos podem contar com a nossa oração quotidiana.

 

in Voz de Lamego, ano 91/39, n.º 4621, 25 de agosto de 2021

 

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